Acordo UE-Mercosul pode avançar nesta semana: o que está em jogo para o agro brasileiro

  • 15/12/2025
(Foto: Reprodução)
Acordo UE-Mercosul: o que está em jogo para o agro brasileiro Depois de 26 anos de negociações, o acordo de livre comércio entre o Mercosul — bloco formado por Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai — e a União Europeia pode avançar nesta semana. O governo brasileiro espera que a assinatura aconteça durante a Cúpula do Mercosul, no próximo sábado (20), em Foz do Iguaçu. Mas depende dos trâmites na Europa, onde o acordo ainda precisa ser confirmado pelos países membros. "A intenção é realizar a votação do acordo com o Mercosul na próxima semana, para permitir que a presidente da Comissão [Ursula von der Leyen] assine o acordo no Brasil em 20 de dezembro", disse uma autoridade da presidência do Conselho da UE na última sexta-feira (12). O Conselho se reunirá nas próximas quinta (18) e sexta (19). Três dias antes, na terça (16), o Parlamento Europeu irá votar as medidas de proteção para o agro local, ponto crítico do acordo. As chamadas salvaguardas, que passaram pela Comissão europeia na última segunda-feira (8), preveem que os benefícios tarifários do Mercosul no acordo podem ser suspensos temporariamente, caso a UE entenda que isso esteja prejudicando algum setor do agro local (saiba mais aqui). As medidas são um aceno da UE para países que têm feito forte oposição ao tratado, como a França. Mas essas regras deixaram o agro brasileiro em alerta. A diretora de relações internacionais da Confederação da Agricultura e Pecuária (CNA), Sueme Mori, disse que as salvaguardas preocupam, pois podem limitar as exportações brasileiras para o mercado europeu, o que é contraditório, já que o acordo prevê livre comércio. "A União Europeia não veio aqui perguntar para o Brasil, Paraguai, Uruguai se a gente concordava ou não (com as salvaguardas)", afirmou Mori. "O que vai ser assinado no dia 20, se for assinado, é o texto que foi negociado (pelos dois blocos)." O Brasil, um dos maiores produtores de alimentos do mundo, deve ser um grande beneficiário do acordo UE-Mercosul. O bloco europeu já é o segundo maior cliente do agro brasileiro, atrás da China e à frente dos Estados Unidos. Confira os principais clientes do agro brasileiro Arte g1 O acordo UE-Mercosul será um passo importante em um ano em que as vendas de produtos do agro para os EUA despencaram, após o tarifaço imposto pelo presidente americano Donald Trump. A sobretaxa acabou sendo retirada em novembro — mas quase metade das exportações do agro brasileiro ainda está submetida a ela. O tarifaço de Trump também atingiu a UE e este é um ponto crucial para que o acordo seja defendido também por países europeus, sobretudo Alemanha e a Espanha, apesar da oposição liderada pela França. Por isso, a imprensa europeia tem noticiado que os franceses terão dificuldades de encontrar apoio suficiente para barrar o tratado. Com ele, a UE também poderá aumentar exportações de carros, máquinas e produtos químicos, além de itens agrícolas, como queijos e vinhos, para o Mercosul. E também poderá reduzir a dependência da China na área de minerais. ➡️ O que o acordo prevê para o agro? O acordo prevê eliminar as tarifas de importação de 77% dos produtos agropecuários que a União Europeia compra do Mercosul. Com isso, o setor poderá aumentar as vendas de diversos itens, como café, frutas, peixes, crustáceos e óleos vegetais, que terão taxas de importação gradualmente zeradas na Europa. As tarifas serão reduzidas em prazos que podem variar de 4 a 10 anos, a depender do produto. Itens como as carnes bovina e de frango, terão cotas de exportação. São alimentos considerados "sensíveis" pelos europeus, pois competem diretamente com a produção local. Veja abaixo os possíveis impactos para os principais produtos do agro. ➡️Potencial para carnes Uma das principais tensões do acordo está no setor de carnes. Pecuaristas europeus, sobretudo da França e da Polônia, resistem ao tratado por temerem perder espaço para os sul-americanos, que podem ganhar competitividade no continente. Atualmente, a França lidera a produção de carne bovina na Europa, enquanto a Polônia ocupa a dianteira na produção de frango. O Brasil é o maior exportador global desses dois tipos de carnes e, há anos, consegue ofertá-los a preços mais baixos do que seus concorrentes. Atualmente, a carne bovina brasileira tem dois tipos de tarifação para ser comprada por países da UE, explica a Associação Brasileira das Indústrias Exportadoras de Carnes (Abiec). Uma delas é a cota Hilton, destinada a cortes nobres, que permite ao Brasil exportar 10 mil toneladas por ano com uma taxa de 20%. Esse percentual será zerado, caso o acordo seja aprovado. Outros tipos de carne bovina têm uma taxa menor, de 12,8%, mais 221,1 euros por 100 kg. Segundo a Abiec, se o acordo UE-Mercosul entrar em vigor, o Brasil deve deixar de pagar essa tarifa, já que passará a ter uma nova cota de exportação em conjunto com os demais países do Mercosul. Pelo tratado, Brasil, Argentina, Uruguai e Paraguai poderão exportar, juntos, até 99 mil toneladas por ano, com uma tarifa inicial de 7,5%. Uma lógica semelhante vai funcionar para as carnes de aves, explica a Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA). Hoje, o setor conta com diferentes cotas de acesso à União Europeia: no caso do frango in natura, por exemplo, o país pode exportar 15.050 toneladas com tarifa zero, enquanto os volumes excedentes pagam 1.024 euros por tonelada. Com o acordo, o Brasil terá, junto com os outros países do Mercosul, uma cota anual de exportação de 180 mil toneladas com tarifa zero. Ela vai começar em um nível menor no primeiro ano e vai sendo aumentada em parcelas anuais iguais até chegar ao total, no sexto ano, detalhou a ABPA. No entendimento da associação, as exportações brasileiras de frango que ocorrerem fora da cota do tratado continuarão sujeitas às regras tarifárias atualmente em vigor. "O que teremos com o Mercosul é outra cota, será adicional", disse a associação. "Se o acordo for implementado com previsibilidade e respeito às regras, há espaço concreto para aumento das exportações brasileiras de carne de frango", concluiu a ABPA. Em 2024, a UE foi apenas o oitavo maior comprador de carnes brasileiras (veja no gráfico abaixo). ➡️ Potencial para o café solúvel O café é o segundo produto brasileiro mais vendido para a UE em valor exportado, depois da soja. O café em grão — que representa 97% das vendas do setor à UE — já entra na Europa sem tarifa. Mas, atualmente, o bloco aplica uma taxa de 9% sobre o café solúvel e de 7,5% sobre o torrado e moído, afirma o diretor-geral do Conselho dos Exportadores de Café do Brasil (Cecafé), Marcos Matos. "O nosso maior concorrente em café solúvel, o Vietnã, já tem tarifa zero. Então, o acordo pode tornar nosso solúvel mais competitivo na Europa", destaca Matos. O acordo UE-Mercosul prevê que as tarifas do café solúvel e torrado e moído zerem em 4 anos. Matos reforça que um acordo comercial é "muito mais do que exportação". Segundo ele, se o tratado for para a frente, há possibilidades de grupos empresariais europeus investirem ainda mais na indústria de café do Brasil. As donas do café: marcas populares no Brasil pertencem a empresas estrangeiras; saiba quem são ➡️ Nada muda para a soja O acordo, no entanto, não deverá ter impacto para a soja, que é o produto do agro brasileiro mais exportado para a União Europeia. Isso porque ela já conta com tarifa zero tanto para o grão, como para o farelo, explica o diretor de Economia da Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais (Abiove), Daniel Furlan Amaral. "Esse tratamento se mantém há muitos anos. Por essa razão, o acordo Mercosul-União Europeia não altera o cenário tarifário da soja", afirma Amaral. Veja quanto dos principais produtos vendidos pelo agro brasileiro vai para a União Europeia Arte g1 Salvaguardas e possíveis impactos para o Brasil As salvaguardas aprovadas pela comissão europeia e que serão analisadas pelo Parlamento nesta terça (16) definem em que situações a UE poderá suspender temporariamente as vantagens tarifárias concedidas ao Mercosul. Na prática, se as importações de um determinado produto agrícola considerado sensível aumentar em 5%, na média de 3 anos, a UE poderá abrir uma investigação para avaliar a possível suspensão dos benefícios. Na proposta original da comissão, divulgada em outubro, esse limite era maior, de 10%. Os integrantes da comissão também reduziram o tempo de duração dessas investigações: de 6 para 3 meses, em geral, e de 4 para 2 meses, para produtos sensíveis. "Isso permite à União Europeia aplicar penalidades de forma muito mais rápida, dando menos tempo aos países do Mercosul para se explicarem e se defenderem", diz Leonardo Munhoz, pesquisador do Centro de Bioeconomia da Fundação Getúlio Vargas (FGV). A comissão também propôs uma nova regra que obriga os países do Mercosul a adotar as mesmas normas de produção exigidas na União Europeia. Segundo Munhoz, essa cláusula não estava prevista no acordo original e pode gerar insegurança jurídica. "A UE pode questionar, por exemplo, se o Brasil usar defensivos agrícolas ou fertilizantes que não são utilizados na Europa", exemplificou. Para a ABPA, essas proteções não eliminam o potencial de exportação, mas podem ter algum efeito sobre a previsibilidade, dependendo de como forem aplicadas. "Do ponto de vista do Brasil, o que defendemos é que qualquer salvaguarda seja estritamente técnica, transparente e baseada em critérios objetivos, de forma a não transformar um mecanismo excepcional em barreira disfarçada", disse a ABPA, ao g1. Acordo que se arrasta desde os anos 90 O acordo de livre comércio UE-Mercosul não vale apenas para produtos agrícolas, mas este setor tem protagonizado boa parte dos embates. As discussões começaram em 1999 e foram paralisadas depois de um acordo inicial alcançado em 2019. As conversas só foram retomadas em 2024, a pedido da Comissão Europeia. O acordo foi, então, anunciado no fim de 2024, o que encerrou o período de negociações e inaugurou o de aprovações pelos países. “É um acordo que envolve praticamente 722 milhões de habitantes e US$ 22 trilhões de Produto Interno Bruto (PIB). É uma coisa extremamente importante, possivelmente seja o maior acordo comercial do mundo", disse o presidente Lula, em novembro, durante o G20 – grupos das maiores economias do mundo. Leia também: Trump anuncia pacote de US$ 11 bilhões para ajudar agricultores dos EUA Tarifaço de Trump continua para ovos brasileiros e acaba com a disparada de vendas para os EUA

FONTE: https://g1.globo.com/economia/agronegocios/noticia/2025/12/15/acordo-ue-mercosul-pode-avancar-nesta-semana-o-que-esta-em-jogo-para-o-agro-brasileiro.ghtml


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